Hoje lembrei-me do dia da tua despedida. Lembrei-me de como dobrei o pano branco e o guardei tão religiosamente no bolso das minhas calças, esperando a hora de te ver partir para acenar-to. Lembrei-me de como tudo parecia simplesmente radiante com a notícia da tua partida, enquanto tu, mancha negra contaminadora de paisagens, apenas permanecias fixa, como que relutante em abandonar algo que não era teu.
Lembrei-me de como o céu, influenciado por ti, ameaçava rugir trovões e descarregar chuva sobre nós, enquanto tu lhe tocavas outra das tuas sinfonias melancólicas que gostas de apresentar àqueles que têm a infelicidade de figurarem na tua vida. Lembrei-me de como culpavas anjos e demónios pela tua má-sorte, rezando palavras de traição e saudade a todos os que sempre te odiaram e nunca te quiseram por perto.
Ver-te partir foi um alívio. Não te ver regressar, foi outro tal.
No fim, ficou apenas o receio de te encontrar à beira-mar, com o vestido negro de ódio e de inveja que exibes sempre com vaidade exuberante, decapitando uma rosa e jogando, uma a uma, as suas pétalas às ondas, amaldiçoando os seres que nunca tiveram a culpa de existires. Ficou apenas o receio de te rever a ti e ao teu manto de neblina duvidosa, onde tentas iludir almas deambulantes que consomes qual carnívoro devora as suas presas.
No fim, ficou apenas o receio de te rever. Por favor, não regresses.
[Este texto é fictício, não estando associado a nenhuma pessoa em concreto]