É final de tarde e um véu negro cobre o céu de nuvens opacas, que matam os raios solares que tentam banhar-me. Um vento forte e frio fustiga-me o corpo, lançando rajadas tremendas, tentando abalroar-me. O solo está coberto de lama fresca, tão húmida e mole que os meus pés se enterram lentamente, imobilizando-me enquanto olho em volta, descrente.
Uma árvore despida prende-me a atenção. Os seus ramos encarquilhados e esguios estendem-se, dobrados, em direcção ao chão. Encontra-se completamente vergada, mas não partida, como que obrigada a fazer uma vénia a alguém esquecido e ausente. Toda aquela imagem macabra envia arrepios pelo meu corpo, à medida que os meus pés se afundam continuamente na lama, que já me dá pelos joelhos.
Mais à frente, onde a neblina espessa e branca começa a rarear, surgem, uma por uma, figuras sinistras indistintas que não passam de vultos a esta distância. Com esforço, tento arrastar-me até mais perto, porque aquelas sombras parecem chamar por mim. Rastejo, literalmente, pela lama que se cola a mim e me torna pesado, com grande custo. E quando estou tão próximo de uma das ditas sombras que me bastaria estender o braço para lhe tocar, é que me apercebo do que são.
Lápides. São pedras tumulares que se estendem por um infindável terreno lamacento, abandonado algures entre o nevoeiro. Contudo não são lápides normais. São monumentos em honra dos amores perdidos. Erguem-se do solo lamacento, permanecendo erectas contra todas as agressões da natureza, apenas por honra do amor. Têm palavras gravadas nas suas faces, memórias de paixões quebradas deixadas para serem recordadas posteriormente.
E eu rendo-me. Deixo o meu coração cair-me do peito e envolver-se na lama. Segundos depois, uma lápide levanta-se do solo, negra como o fundo da solidão. E nela, tem gravada as palavras que eternizarão o amor nosso perdido.