domingo, 12 de junho de 2011

Restos de Humanidade


Foi num domingo. Lembro-me como se fosse ontem...

Estavas a passear-te pela mata, de cabeça baixa, pensando na tua vida. Arrastavas os pés, derrotado, enquanto combatias os pensamentos que tentavam desmoronar-te. Não tinhas ninguém ao teu lado e era isso que mais te custava. Olhavas para a direita, e não vias ninguém. O resultado do teu olhar sobre a esquerda era exactamente o mesmo. E quanto mais te apercebias da tua solidão, mais te enterravas em ti mesmo, sofrendo como se te torcessem o coração e to arrancassem.

Dois dias antes, tinhas feito um acto digno de ser categorizado como 'demente'. Afogado na mágoa da tua solidão, privaste-te do teu coração e puseste-o à janela. Querias tanto, mas tanto que alguém reparasse nele e se apaixonasse, ou pelo menos que tivesse compaixão, que ele manteve-se activo, batendo freneticamente, mesmo sem o teu sangue a irrigá-lo. Impressionante mesmo. Contudo, a tua tentativa de promoção do teu amor foi um total fracasso e lá tiveste de o coser novamente ao peito, sem nenhum outro para se lhe juntar.

As memórias atormentavam-te e faziam-te desejar desaparecer. Apareciam escritas nos troncos das árvores pelas quais ias passando, como fantasmas do passado que juraram assombrar-te até o amor se dignar a habitar-te. Deixavam-te num ponto em que desejavas enlouquecer, apenas perder a cabeça e deixar para trás todas as complexas teias do amor. Contudo, era-te impossível enlouqueceres. Estavas demasiado consciente, demasiado lúcido para perderes noção das barreiras, dos limites que a tua mentalidade impunha.

No meio da mata, eras um homem abandonado. Sozinho, não como uma ilha num mar gigantesco, mas sim como um planeta sem galáxia, numa extremidade esquecida do universo. Rejeitado pela ignorância dos outros e ainda mais distante pelo teu conforto. No entanto, no meio daquela mata, achaste-te a ti próprio. Eras pouco mais que um ser humano, se calhar nem tanto. Não desististe e combateste-te. Encontraste dentro de ti, restos de humanidade que te afastaram da demência. Viveste mais um dia. Mais um dia na tua luta contra tudo. Mais um dia na luta pelo amor.

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Fragilidade

Não, eu não vou sucumbir à tua vontade... Por mais que me tentes incutir que os teus mandamentos são os correctos, que os teus desejos são a vontade de uma nação, eu dir-te-ei: "Eu sou um homem que é uma nação só por si".

Menosprezaste-me... Trataste-me como se nada fosse, enquanto me querias. Lamento, mas pensei que soubesses que não me podes conquistar rejeitando-me. Não me podes fazer correr atrás de ti, abandonando-me, pois eu trilho o meu próprio caminho.

Julgaste-me fraco como todos os outros que fazias prisioneiros no teu castelo de contos-de-fada recheado de medos e cobiças. Eu sou muito mais que os escanzelados esfomeados de amor que atrais para lá com promessas de um final feliz. Muito mais.

Sou tanto quanto tu, não menos... Talvez um pouco mais... Não, somos tão iguais quanto diferentes! Queremos o mesmo, de diferentes maneiras. Não faço intenção de trocar o céu pelo mar para ter amor. Tu, por outro lado, venderias o paraíso ao inferno por tal presente.

Lamento, no final da nossa história. No final, lamento o princípio. Não queria que um conto destes figurasse no meu livro, mas tu escreveste-o contra a minha vontade. Presumiste a minha fragilidade, assumindo-a como trunfo na tua manga. No final da nossa história, não te perdi, mas tu perdeste-me.